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O AMULETO DISFARÇADO


 O patuá, ou conhecido em algumas localidades como “bolsa de mandinga” - sendo elemento amplamente difundido nos adereços afrorreligiosos como proteção espiritual até hoje- teve importante contribuição para uma das principais rebeliões no Brasil e não serviu, apenas, como amuleto ligado ao corpo. Na verdade, com o passar do tempo, foi aglutinado como adereço para afastar infortúnios aos povos de terreiro.

Historiograficamente, é sabido que na madrugada do dia 24 para o dia 25 de janeiro de 1835, em Salvador, à véspera do dia da Lavagem do Bonfim, aconteceu uma das revoltas negras mais célebres na História do Brasil. Conhecida como Revolta dos Malês, o movimento contou com escravizados de ascendência islâmica para invadir a Câmara Municipal da Cidade, onde ali encontrava-se preso um dos agentes dessa revolta: Pacífico Licutan.
Ao que consta nos escritos de historiadores renomados a respeito da Revolta dos Malês (vide João José Reis e Vanicléia Silva Santos), as ideias do movimento foram popularizadas por cativos de ascendência supracitada, como Luiza Mahin e Manuel Calafate, ambos que, sabendo escrever e ler em árabe, anotavam pequenas estratégias de como ocorreria a rebelião e as punham em pequenas bolsas de couro, entregando, assim, a outros escravizados de mesma origem muçulmana e divulgando clandestinamente o movimento entre os seus. Sem dúvidas, tática bastante sagaz para ludibriar o conhecimento dos senhores de engenho que entendiam aqueles objetos como feitiçaria ou mandinga.
Com o passar dos anos e as intensas interferências culturais muçulmanas em solo brasileiro, tal objeto foi inserido, também, como espécie de talismã religioso por muitos iniciados no candomblé. Dentro deles, muitas vezes, guardava- se rezas, grãos, penas e uma infinidade de elementos os quais foram replicados, dependendo da tradição que se segue, de geração a geração ao povo de santo.
É de conhecimento geral que a origem do patuá não remonta, apenas, à região guineense africana - consideravelmente islamizada à época, uma vez que culturas europeias e indígenas utilizavam amuletos similares. Nem pode-se afirmar com propriedade que o uso desses objetos, no Brasil, foi iniciado com a Revolta dos Malês. No entanto, é indiscutível afirmar que, por aqui, a importância histórica dessas “bolsas de mandinga” não se deveu apenas para afastar energias negativas e invisíveis, mas para sacudir Salvador em uma de suas manhãs mais truculentas no século XIX.
Obs: Mandingas também eram chamados os cativos advindos daquela região africana.
Texto: Dofono Cléston de Airá - 30/04
Imagem meramente ilustrativa: domínio público

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