TERREIRO DA CASA BRANCA DO ENGº VELHO – Aonde nasceu o preto brasileiro
Em 27 de junho de 1986, há 34 anos atrás o Ministro da Cultura da época, Celso Monteiro Furtado fez história. Ele reconheceu e homologou o primeiro templo religioso não católico no Brasil como patrimônio histórico, o TERREIRO DA CASA BRANCA DO ENGENHO VELHO. Seu Processo foi de número 1.067-T-82, Inscrição número 93, Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, e Inscrição número 504, Livro Histórico) decidido em maio de 1984, em reunião do Conselho do IPHAN. Repetindo o reconhecimento feito pela cidade de Salvador anos antes em 1982. Depois o Governo da Bahia também o faria posteriormente em 1987. Em decorrência disso toda a sua área foi desapropriada, para fins de manutenção de seus aspectos culturais e importância histórica.
Esse reconhecimento, pioneiro também em toda a América, é fruto de décadas de pesquisas realizadas por dezenas de antropólogos, etnólogos, sociólogos e historiadores como Pierre Verger (FOTOS 2 e 10), Ruth Landes (FOTO 9), Edison Carneiro, Roger Baptiste, Vivaldo da Costa Lima, Renato da Silveira, entre outros sobre as origens do candomblé baiano. Todos chegaram a mesma resposta, o axé mais antigo que se tem notícia é o da BARROQUINHA.
No período da escravidão, houve a chegada na Bahia de muitos negros escravizados do reino de OYÓ e KETU, devido a derrota na guerra contra o grande reino de DAOMÉ, que chegou a ser o maior da África Central até ser invadido pela França no século XIX. Entre eles também vieram membros das famílias reais desses reinos.
Reunidos em engenhos de cana, um grupo se organizou numa região conhecida como Barroquinha em Salvador, nome de uma antiga Igreja do bairro (FOTO 5), onde fundaram uma comunidade de Nagôs (nomes dados aos iorubas), que segundo historiadores, remonta mais ou menos 300 anos de existência. Sabe-se que esta comunidade fora fundada por três negras africanas, oriundas dessa realeza, seus nomes eram: Iya Detá, Iya Kalá e Iya Nassô. Seu principal objetivo foi estabelecer um culto africanista no Brasil, pois viram essas mulheres, que se alguma coisa não fosse feita aos seus irmãos negros e descendentes, nada teriam para preservar do culto de sua religião, já que os negros que aqui chegavam eram batizados e obrigados a praticarem a religião católica.
Como este culto no Brasil, teria que ser similar ao culto praticado na África foi criada uma “mini-África”, ou seja, uma casa aonde se tentaria reproduzir ou se adaptar o culto dos orixás africanos. Outra adaptação foi a junção dos cultos, pois no continente africano cada orixá estava ligado a uma cidade ou reino como Xangô em Oyó e Oxum em Ijexá, então decidiu-se cultuar todos no mesmo espaço, estudiosos afirmam que essa forma escolhida contribuiu para que os africanos de diferentes etnias e idiomas se unissem e criassem algo novo, a partir daquele momento. Foi nessa reinvenção do culto, que nasceu o CANDOMBLÉ e se manteve até os dias de hoje e assim se possibilitou a construção de uma nova identidade negra, nasce ETNOGRAFICAMENTE o preto brasileiro ou crioulo, para alguns especialistas. Participaram da fundação também descedentes da etnia TAPÁ, EGBÁ, EFAN e IJEXÁ, por isso se manteve o culto de divindades dessa região. Dessa forma cria-se o XIRÊ (círculo aonde os filhos dançam dentro do terreiro) aonde dançam Oxum e o Logunedé dos Ijexás, o Xangô e a Iansã dos Oyós, o Oxóssi dos Ketus, o Oxalá, Oxalufã e Oxaguiã dos Efans e assim vários povos de diferentes idiomas se unem em um só propósito. Esse templo era localizado na antiga ladeira do Berquó, no centro histórico de Salvador e teve a escolha de IYÁ NASSÔ para comandá-lo (nome de um título de nobreza no antigo reino de Oyó, na África), uma africana liberta que no Brasil ganhou o nome de FRANCISCA DA SILVA. Segundo pesquisadores, ela conseguiu retornar para África em 1837, após a Revolta dos MALÊS, por medo de represálias ao seu filho que teria participado do levante.
Os africanos que se encontravam ali, lugar deserto naquela época, porém próximo ao Palácio de sua Real Majestade, tiveram receio da intervenção das autoridades no seu culto, por isso Iya Nassô resolveu arrendar terras do Engenho Velho do Rio Vermelho de Baixo, no trecho chamado Joaquim dos Couros (atualmente Av. Vasco da Gama), estabelecendo aí o primeiro Terreiro de Culto Africano na Bahia da tradição do Ketu. Seu nome vem segundo a oralidade, devido ao costume das pessoas indicarem sua localização pela “Casinha” branca que ficava no alto do morro (FOTO 3).
É chamada de “MÃE DE TODAS AS CASAS”, pois dela nasceu os terreiros do GANTOIS (fundado por Maria Júlia da Conceição Nazaré) e do AXÉ OPÔ AFONJÁ (fundado por Eugênia Ana dos Santos), após disputas pela sucessão. Um grande diferencial é a tradição MATRIARCAL, homens só podem ser ogãs e portadores de títulos honoríficos. A famosa TIA CIATA do RJ, foi iniciada nesta casa, fazia parte do chamado grupo “MULHERES DE PARTIDO ALTO”. Ela acompanhou até o RJ o Bamboxé OBITIKÔ e o ajudou na fundação do candomblé de JOÃO DE ALABÁ, o 1º do RJ, implantando também essa nova forma de união entre os africanos. A religião foi o elo de criação e comunicação dos pretos em todo o território brasileiro. Há estudos que apontam também outras práticas afro-religiosas anteriores na cidade do Rio de Janeiro, comumente chamadas pela crônica da época de “MACUMBARIA CARIOCA”.
Esse terreiro já recebeu visitas de presidentes, Ministros, representante do VATICANO e outras religiões, além de artistas do mundo inteiro. Foi a primeira instituição de cultura negra a receber esse reconhecimento no Brasil e na América do Sul. A praça em frente recebeu projeto de revitalização de Niemayer.
Sua linha sucessória desde a sua fundação segue uma tradição de quase 200 anos com: Yá Nassô, Yá Marcelina da Silva (OBÁ TOSI), Maria Júlia Figueiredo (OMONIQUÊ), Mãe SUSSU, Tia MASSI (FOTO 7), Papai OKÉ, Mãe Oxum NIKÉ e Mãe TATÁ (FOTO 8) de Oxum (TOMILÁ), falecida no final do ano passado. O falecimento da líder e sua sucessão movimenta a Bahia inteira, além dos mais de 100 Terreiros afiliados a sua árvore genealógica e forçar o fechamento da casa por um período aproximado de um ano, enquanto dura o luto.
Sua existência nesses 2 séculos mostram toda a estratégia de resistência ao qual os negros tiveram que traçar para sobreviver a escravidão, ao racismo e a perseguição que se mantém até os dias de hoje. Um dos reconhecimentos mais significativos da história do IPHAN e demonstra como a importância da Casa Branca supera os limites do muro de seu axé indo até a alma de cada brasileiro e sua influência cultural na sociedade brasileira.
Veja mais sobre cultura brasileira:
Site - www.ipcb-rj.gov.br
Instagram - @bondeangola
Em 27 de junho de 1986, há 34 anos atrás o Ministro da Cultura da época, Celso Monteiro Furtado fez história. Ele reconheceu e homologou o primeiro templo religioso não católico no Brasil como patrimônio histórico, o TERREIRO DA CASA BRANCA DO ENGENHO VELHO. Seu Processo foi de número 1.067-T-82, Inscrição número 93, Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, e Inscrição número 504, Livro Histórico) decidido em maio de 1984, em reunião do Conselho do IPHAN. Repetindo o reconhecimento feito pela cidade de Salvador anos antes em 1982. Depois o Governo da Bahia também o faria posteriormente em 1987. Em decorrência disso toda a sua área foi desapropriada, para fins de manutenção de seus aspectos culturais e importância histórica.
Esse reconhecimento, pioneiro também em toda a América, é fruto de décadas de pesquisas realizadas por dezenas de antropólogos, etnólogos, sociólogos e historiadores como Pierre Verger (FOTOS 2 e 10), Ruth Landes (FOTO 9), Edison Carneiro, Roger Baptiste, Vivaldo da Costa Lima, Renato da Silveira, entre outros sobre as origens do candomblé baiano. Todos chegaram a mesma resposta, o axé mais antigo que se tem notícia é o da BARROQUINHA.
No período da escravidão, houve a chegada na Bahia de muitos negros escravizados do reino de OYÓ e KETU, devido a derrota na guerra contra o grande reino de DAOMÉ, que chegou a ser o maior da África Central até ser invadido pela França no século XIX. Entre eles também vieram membros das famílias reais desses reinos.
Reunidos em engenhos de cana, um grupo se organizou numa região conhecida como Barroquinha em Salvador, nome de uma antiga Igreja do bairro (FOTO 5), onde fundaram uma comunidade de Nagôs (nomes dados aos iorubas), que segundo historiadores, remonta mais ou menos 300 anos de existência. Sabe-se que esta comunidade fora fundada por três negras africanas, oriundas dessa realeza, seus nomes eram: Iya Detá, Iya Kalá e Iya Nassô. Seu principal objetivo foi estabelecer um culto africanista no Brasil, pois viram essas mulheres, que se alguma coisa não fosse feita aos seus irmãos negros e descendentes, nada teriam para preservar do culto de sua religião, já que os negros que aqui chegavam eram batizados e obrigados a praticarem a religião católica.
Como este culto no Brasil, teria que ser similar ao culto praticado na África foi criada uma “mini-África”, ou seja, uma casa aonde se tentaria reproduzir ou se adaptar o culto dos orixás africanos. Outra adaptação foi a junção dos cultos, pois no continente africano cada orixá estava ligado a uma cidade ou reino como Xangô em Oyó e Oxum em Ijexá, então decidiu-se cultuar todos no mesmo espaço, estudiosos afirmam que essa forma escolhida contribuiu para que os africanos de diferentes etnias e idiomas se unissem e criassem algo novo, a partir daquele momento. Foi nessa reinvenção do culto, que nasceu o CANDOMBLÉ e se manteve até os dias de hoje e assim se possibilitou a construção de uma nova identidade negra, nasce ETNOGRAFICAMENTE o preto brasileiro ou crioulo, para alguns especialistas. Participaram da fundação também descedentes da etnia TAPÁ, EGBÁ, EFAN e IJEXÁ, por isso se manteve o culto de divindades dessa região. Dessa forma cria-se o XIRÊ (círculo aonde os filhos dançam dentro do terreiro) aonde dançam Oxum e o Logunedé dos Ijexás, o Xangô e a Iansã dos Oyós, o Oxóssi dos Ketus, o Oxalá, Oxalufã e Oxaguiã dos Efans e assim vários povos de diferentes idiomas se unem em um só propósito. Esse templo era localizado na antiga ladeira do Berquó, no centro histórico de Salvador e teve a escolha de IYÁ NASSÔ para comandá-lo (nome de um título de nobreza no antigo reino de Oyó, na África), uma africana liberta que no Brasil ganhou o nome de FRANCISCA DA SILVA. Segundo pesquisadores, ela conseguiu retornar para África em 1837, após a Revolta dos MALÊS, por medo de represálias ao seu filho que teria participado do levante.
Os africanos que se encontravam ali, lugar deserto naquela época, porém próximo ao Palácio de sua Real Majestade, tiveram receio da intervenção das autoridades no seu culto, por isso Iya Nassô resolveu arrendar terras do Engenho Velho do Rio Vermelho de Baixo, no trecho chamado Joaquim dos Couros (atualmente Av. Vasco da Gama), estabelecendo aí o primeiro Terreiro de Culto Africano na Bahia da tradição do Ketu. Seu nome vem segundo a oralidade, devido ao costume das pessoas indicarem sua localização pela “Casinha” branca que ficava no alto do morro (FOTO 3).
É chamada de “MÃE DE TODAS AS CASAS”, pois dela nasceu os terreiros do GANTOIS (fundado por Maria Júlia da Conceição Nazaré) e do AXÉ OPÔ AFONJÁ (fundado por Eugênia Ana dos Santos), após disputas pela sucessão. Um grande diferencial é a tradição MATRIARCAL, homens só podem ser ogãs e portadores de títulos honoríficos. A famosa TIA CIATA do RJ, foi iniciada nesta casa, fazia parte do chamado grupo “MULHERES DE PARTIDO ALTO”. Ela acompanhou até o RJ o Bamboxé OBITIKÔ e o ajudou na fundação do candomblé de JOÃO DE ALABÁ, o 1º do RJ, implantando também essa nova forma de união entre os africanos. A religião foi o elo de criação e comunicação dos pretos em todo o território brasileiro. Há estudos que apontam também outras práticas afro-religiosas anteriores na cidade do Rio de Janeiro, comumente chamadas pela crônica da época de “MACUMBARIA CARIOCA”.
Esse terreiro já recebeu visitas de presidentes, Ministros, representante do VATICANO e outras religiões, além de artistas do mundo inteiro. Foi a primeira instituição de cultura negra a receber esse reconhecimento no Brasil e na América do Sul. A praça em frente recebeu projeto de revitalização de Niemayer.
Sua linha sucessória desde a sua fundação segue uma tradição de quase 200 anos com: Yá Nassô, Yá Marcelina da Silva (OBÁ TOSI), Maria Júlia Figueiredo (OMONIQUÊ), Mãe SUSSU, Tia MASSI (FOTO 7), Papai OKÉ, Mãe Oxum NIKÉ e Mãe TATÁ (FOTO 8) de Oxum (TOMILÁ), falecida no final do ano passado. O falecimento da líder e sua sucessão movimenta a Bahia inteira, além dos mais de 100 Terreiros afiliados a sua árvore genealógica e forçar o fechamento da casa por um período aproximado de um ano, enquanto dura o luto.
Sua existência nesses 2 séculos mostram toda a estratégia de resistência ao qual os negros tiveram que traçar para sobreviver a escravidão, ao racismo e a perseguição que se mantém até os dias de hoje. Um dos reconhecimentos mais significativos da história do IPHAN e demonstra como a importância da Casa Branca supera os limites do muro de seu axé indo até a alma de cada brasileiro e sua influência cultural na sociedade brasileira.
Veja mais sobre cultura brasileira:
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